Correr com eles<br>é só parte da solução

Filipe Diniz

Passos Co­elho fala «sobre in­ves­ti­mento» para uma pla­teia de «in­ves­ti­dores», e por­tanto fala à von­tade: «o custo do tra­balho para as em­presas ainda é muito ele­vado» […] e re­duzi-lo «será um ob­jec­tivo se­gu­ra­mente im­por­tante nos pró­ximos anos». Trata-se «de sermos mais atrac­tivos para o in­ves­ti­mento.»

Portas fala num al­moço par­ti­dário. In­forma que o seu par­tido há quatro dé­cadas que é cha­mado ao go­verno «em si­tu­a­ções de emer­gência». Agora pede «a opor­tu­ni­dade para go­vernar numa si­tu­ação de cres­ci­mento». Este «cres­ci­mento», que só a pro­pa­ganda do Go­verno des­cor­tina, é ma­ti­zado nas pa­la­vras de Portas: «talvez a eco­nomia cresça mais e a dis­tri­buição dos frutos do cres­ci­mento seja mais justa». Re­giste-se a re­serva do talvez. Portas quer con­ti­nuar a ter «opor­tu­ni­dade de go­vernar», e o «cres­ci­mento» da pro­pa­ganda go­ver­na­mental é um pe­dre­gulho pen­du­rado ao pes­coço de tal «opor­tu­ni­dade». Essa opor­tu­ni­dade passa pela mu­dança de par­ceiro go­ver­na­mental.

Já vimos an­te­ri­or­mente este filme. Há qua­renta anos que o CDS de­sem­penha – seja para o PSD, seja para o PS – o papel de ben­gala da po­lí­tica de di­reita. Cha­mado ao go­verno «com a casa a arder», como diz, sai do go­verno com a casa em cinzas, com o povo e o País mais po­bres, mais ex­plo­rados e mais de­pen­dentes.

É disso também que fala Passos Co­elho: de go­vernar contra os tra­ba­lha­dores e o povo e ainda por cima se las­timar de não ter ido su­fi­ci­en­te­mente longe.

Veja-se o que diz o Eu­rostat. Em 2014, o custo ho­rário do tra­balho em Por­tugal era o 17.º mais baixo da UE28. Se con­si­de­rados apenas os sa­lá­rios, bai­xava uma po­sição, fi­cando atrás de Malta. Entre 2013 e 2014 esse custo baixou 0,8% em Por­tugal, mas subiu 1,4% na UE28. A manter-se o ritmo de cres­ci­mento de ou­tros países (e a po­lí­tica de di­reita no nosso) Por­tugal será ul­tra­pas­sado por Es­tónia, Es­lo­vá­quia, Croácia, Po­lónia.

Passos Co­elho e Portas estão de saída e não é a sub­ser­vi­ência pe­rante o grande ca­pital que os vai aguentar. A questão é outra: é romper a sério com a po­lí­tica que vê no em­po­bre­ci­mento do povo e na ex­plo­ração dos tra­ba­lha­dores o ca­minho da «com­pe­ti­ti­vi­dade». Para essa po­lí­tica a ben­gala do CDS está sempre dis­po­nível. E o PS tem largo an­te­ce­dente na sua uti­li­zação.

Saber qual é o pro­blema é meio ca­minho an­dado para o re­solver. E o pro­blema não é de caras, é de classe.

 



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